MPPR reforça atuação voltada ao combate ao racismo

Evento reunirá integrantes da instituição e representantes de organizações da sociedade civil, em ambiente virtual, para debaterem a atuação institucional voltada à promoção da igualdade racial

Nesta semana, no dia 20 de novembro, é celebrado o Dia da Consciência Negra, data que reforça a importância do enfrentamento e do combate ao racismo e a todas as formas de discriminação contra a população negra. A propósito da data, o Ministério Público do Paraná (MPPR) promove, nesta quinta-feira (18), às 10 horas, um evento que reunirá integrantes da instituição e representantes de organizações da sociedade civil, em ambiente virtual, para debaterem a atuação institucional voltada à promoção da igualdade racial.

Aberta à participação do público, que poderá enviar perguntas aos participantes, a live em alusão ao Dia da Consciência Negra é uma iniciativa do Núcleo de Promoção da Igualdade Étnico-Racial (Nupier) com a parceria do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Proteção aos Direitos Humanos, unidades do MPPR.

“O Ministério Público do Paraná reforça, por ocasião da celebração do Dia da Consciência Negra, o compromisso permanente da Instituição de enfrentamento a todas as formas de discriminação, com especial destaque à atuação direcionada à indução e ao monitoramento de políticas públicas destinadas à promoção da igualdade étnico-racial”, enfatizou o procurador-geral de Justiça, Gilberto Giacoia.

Cenário

Alguns números exemplificam tal realidade de desigualdade. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que 56,1% da população do país se declaram negra – dado que considera a soma de pretos e pardos. No entanto, o segmento é também maioria entre a população carcerária do país (60%), estando por igual em maior proporção entre o contingente de pessoas sem ocupação ou subocupadas – em 2018, 64,2% das pessoas que não tinham emprego eram negras, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad).

Outra estatística que demonstra a diferença é o contexto da violência no país. De acordo com o Atlas da Violência, elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea), em 2019, os negros representaram 77% das vítimas de homicídios,  mostrando-se a probabilidade de um negro ser assassinado 2,6 vezes superior à de uma pessoa não negra.

Políticas públicas

Um dos participantes do debate do dia 18 Frei David Santos, diretor executivo da organização não-governamental Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes (Educafro) – rede de pré-vestibulares comunitários com atuação em todo o país –, considera a necessidade de ampliação de políticas públicas voltadas ao ingresso e à permanência da juventude negra no ensino superior uma das necessidades para a transformação dessa realidade.

“Além do acesso, é preciso que o Estado garanta os meios para que os jovens se mantenham nas instituições de ensino. As dificuldades enfrentadas por essa população são muitas, tendo sido especialmente agravadas com a pandemia. Não temos o número preciso, mas estimamos que, se antes de 2020 cerca de 30% dos jovens que ingressaram no ensino superior a partir de cotas ou outras políticas afirmativas acabaram por deixar as salas de aula, hoje esse percentual possivelmente é de aproximadamente 60%. E isso é um absurdo, já que são recursos públicos investidos. Queremos ver as salas das universidades, especialmente as públicas, federais e estaduais, cheias, do primeiro ao último semestre”, destacou Frei Davi.

Com atuação de mais de 20 anos dedicados ao debate sobre políticas afirmativas, Frei David também destaca a importância do aperfeiçoamento constante da atuação dos órgãos do sistema de justiça, entre eles o Ministério Público, no sentido de buscar a responsabilização daqueles que cometem o crime de racismo, bem como para ampliar as possibilidades de efetivação de direitos constitucionais da população negra.

“Considerando ser o Ministério Público integrado por profissionais com excelente formação e com grande senso de responsabilidade na defesa dos direitos humanos, é muito importante que tenhamos a instituição como aliada na luta pela ampliação do acesso da população negra à educação”, ponderou.

No estado, o MPPR – por meio do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Proteção aos Direitos Humanos –, em conjunto com as Defensorias Públicas da União e do Estado, participa de um grupo de trabalho com representantes das instituições públicas estaduais de ensino superior. O Colegiado tem o objetivo de debater e propor medidas práticas para o aprimoramento e o monitoramento das políticas afirmativas, com vistas ao cumprimento das previsões constitucionais, do Estatuto da Igualdade Racial e da Lei Federal 2.711/2012 – normativas que buscam garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades e a defesa de seus direitos.

Núcleo Especializado

Desde 2012, o Ministério Público do Paraná possui o Núcleo de Promoção da Igualdade Étnico-Racial (Nupier), unidade coidealizadora da live desta quinta-feira (18). A procuradora de Justiça e coordenadora do Núcleo, Miriam de Freitas Santos, comentou a importância do debate.

“Importante registrarmos que o Dia da Consciência Negra marca a data da morte de Zumbi dos Palmares, figura que traz o símbolo da resistência dos negros contra a escravatura. Quanto ao Ministério Público entendemos que seus membros devam atuar contra o racismo no sentido da sensibilização do sistema de justiça para com as causas da população negra, além da implementação de medidas para a prevenção da violência e discriminação racial contra os afrodescendentes, além de proteger seu patrimônio cultural e locais de culto. Nota-se que o aparato estatal é dirigido ao combate das populações periféricas constituídas primordialmente por pretos e pardos que vivem em condições de miserabilidade, ferindo o princípio da dignidade da pessoa humana e tornando inexistente o Estado Democrático de Direitos”.

A procuradora de Justiça também destacou o papel estratégico institucional no incentivo à promoção de práticas antirracistas e elenca o que considera serem condutas nessa direção:

“A implementação de políticas públicas e ações afirmativas, como por exemplo, o estudo da história da África nas escolas ministradas por pessoas capacitadas; o incentivo a criação de Conselhos Municipais de Promoção da Igualdade Racial; a fiscalização do percentual de cotas raciais nos concursos públicos; a implementação nos cursos de promotores substitutos de matéria específica de questões raciais, bem como com relação à reciclagem de promotores de Justiça, além da inserção do tema em seminários e congressos, por ser uma matéria não afeta a grade curricular de Faculdades e Universidades.

Outra possibilidade é a realização de Audiências Públicas para aferir as reais necessidades desta população marginalizada. Enfim, falta-lhes tudo e a atuação antirracista deve ser uma conduta geral de todos os integrantes do MPPR. Como disse Ângela Davis, não basta não ser racista, tem de ser antirracista”, concluiu.

O procurador de Justiça e coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Proteção aos Direitos Humanos do MPPR, Olympio de Sá Sotto Maior Neto, ressalta a importância do debate sobre o trabalho do Ministério Público nessa temática.

“Especialmente no momento atual, em que vemos tantos direitos já consagrados pela nossa Constituição serem desrespeitados, a atuação institucional voltada à responsabilização daqueles que praticam qualquer forma de discriminação e ainda, para além disso, à promoção da igualdade para o exercício pleno e efetivo das garantias constitucionais deve ser o norte buscado pelos integrantes do Ministério Público brasileiro”, enfatizou.

Práticas internas

A qualificação dos membros do Ministério Público para a atuação na área é também uma preocupação da Associação Paranaense do Ministério Público (APMP). “O combate ao racismo e a promoção da igualdade racial devem estar de forma permanente e prioritária na agenda do Ministério Público. Trabalhamos para que os promotores e promotoras de Justiça de todo o estado estejam plenamente qualificados e constantemente atualizados sobre a legislação na área”, explicou o presidente da entidade, promotor de Justiça André Pasternak Glitz.

Além disso, a adoção de práticas antirracistas e políticas afirmativas no âmbito institucional também é uma prioridade para a organização. “O Ministério Público possui um importante protagonismo, por isso, é fundamental que tenhamos ações que sejam exemplo para a construção de uma sociedade cada vez mais justa e que corrija o histórico de graves violações aos direitos humanos da população negra”, destacou Glitz.

Desde 2004, o Ministério Público do Paraná adota o sistema de cotas para candidatos negros em seus concursos públicos para o ingresso de membros e servidores. Desde então, diversas iniciativas vêm sendo implementadas na perspectiva de garantir à população negra a efetivação da igualdade de acesso a cargos públicos, a defesa dos direitos étnicos individuais e o combate à discriminação e a qualquer forma de intolerância étnica. Mais recentemente, na perspectiva de consolidação das previsões do Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010), a seleção de estagiários da instituição também considera a destinação de 30% das vagas aos estudantes negros.

Compromisso internacional

Em maio deste ano, o Brasil ratificou a Convenção Interamericana Contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância – documento que confirma a adesão do país ao compromisso internacional de prevenir, eliminar, proibir e punir atos e manifestações de racismo, discriminação racial e intolerância.

“Esse tratado inova o ordenamento jurídico de nosso país. O Estado brasileiro, sobretudo o Ministério Público, em sua acepção de fiscal da lei, tem o dever de monitorar o cumprimento dessa norma jurídica. Portanto, na esfera interamericana, caso o Brasil, por meio de suas autoridades, venha a descumprir os termos da Convenção, o Brasil poderá ser processado e até mesmo condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos”, explicou o promotor de Justiça Rafael Osvaldo Machado Moura, que atua no Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Proteção aos Direitos Humanos do MPPR.

“Na esfera interna, inclusive para prevenir que o Brasil passe ‘vexame’ internacional, os órgãos do sistema de Justiça, sobretudo o Ministério Público, têm o dever de respeitar os termos desse tratado e também de garantir que os particulares respeitem esses direitos”, completou Moura.

O significado da ratificação da Convenção Interamericana e seu impacto na atuação institucional voltada ao combate à discriminação foi tema da edição do programa MP no Rádio desta semana, que pode ser acessado aqui.

Data histórica

O Dia da Consciência Negra foi oficialmente instituído pela Lei 12.519, de 10 de novembro de 2011. A data faz referência à morte de Zumbi, então líder do Quilombo dos Palmares, em 1695, que se transformou em símbolo da resistência dos negros contra a escravatura.

Serviço:

Live: Dia da Consciência Negra
Data: Quinta-feira, 18 de novembro
Horário: 10 horas