Imagine ser arrancado da sua casa, da sua rotina, do convívio com a sua família, e colocado atrás das grades, acusado de um crime horrível que você jamais cometeu. Agora imagine que tudo isso aconteceu por causa de uma única letra — um “i” a mais no seu nome. Parece absurdo? Pois foi exatamente o que aconteceu com Jabson Andrade da Silva, um eletricista de 56 anos morador da Zona Norte de São Paulo. Ele passou mais de uma semana preso injustamente por conta de um erro grotesco na grafia do nome do verdadeiro acusado, que sequer morava no mesmo estado. Este caso não só choca pela violência da injustiça, mas também escancara falhas perigosas no nosso sistema de Justiça, que precisa urgentemente de revisão e responsabilidade.
O erro de grafia que virou sentença
Tudo começou com um mandado de prisão expedido na Bahia, onde o verdadeiro acusado, Jabison Andrade da Silva, era investigado por um grave crime de estupro de vulnerável. No entanto, o documento judicial foi emitido com erro de grafia e acabou recaindo sobre Jabson, que jamais teve qualquer envolvimento com o caso. A única semelhança entre os dois era o nome parecido. O sistema que deveria checar com rigor CPF, filiação, data de nascimento ou mesmo o estado de residência falhou de forma absurda. E por causa disso, um homem inocente foi algemado, encarcerado e colocado para viver dias de terror.
A prisão injusta e o sofrimento na cadeia
Jabson foi preso no dia 7 de julho e levado ao Centro de Detenção Provisória (CDP) de Pinheiros, onde passou oito dias de sofrimento. Segundo o próprio eletricista, ele sequer teve tempo de entender o que estava acontecendo. Os agentes o trataram com frieza e violência, como se já estivesse condenado. Ele relatou que foi empurrado, coagido a tirar a roupa e forçado a dormir no chão. Tudo isso sem direito a um julgamento, sem qualquer espaço para defesa. Ele só soube qual era a acusação quando já estava atrás das grades. “É enlouquecedor”, disse em entrevista ao G1. Essa experiência não deixou apenas marcas físicas, mas profundas feridas emocionais que nenhum pedido de desculpas poderá apagar.
Falhas sistêmicas e a ausência de checagem
O que mais assusta nesse caso é a facilidade com que o erro foi cometido. A ordem de prisão foi emitida sem a devida conferência dos dados essenciais. Ninguém verificou o CPF ou a filiação. O mandado de prisão apenas levava o nome grafado com “i”, e isso foi suficiente para que a polícia paulista fosse atrás da pessoa errada. Como informou o advogado João Valença, do VLV Advogados, mandados de prisão devem obrigatoriamente conter identificação completa e precisa do acusado, e a ausência desses dados compromete a legalidade da própria ordem. Não houve tentativa de cruzar os dados com bancos nacionais, nem de contatar a defesa. Esse tipo de descuido mostra que o problema não está apenas na emissão do mandado, mas também na forma como os sistemas de Justiça e segurança pública se comunicam — ou deixam de se comunicar. Enquanto Jabson sofria em São Paulo, o verdadeiro acusado continuava foragido na Bahia.
O impacto na vida de um inocente
O dano causado por esse erro vai muito além do tempo de prisão. Jabson relatou que perdeu trabalho, passou a ser visto com desconfiança pelos vizinhos e sentiu sua saúde mental abalada. Um dos piores efeitos de uma prisão injusta é o estigma social, que permanece mesmo após a liberdade. As pessoas ainda olham torto, ainda se perguntam se “não havia algo de errado”. É o tipo de dano moral e psicológico que dificilmente pode ser revertido. E mais: o trauma de passar pela cadeia, ser tratado como criminoso, viver com medo e humilhação, permanece por muito tempo. Não há indenização que compense essa ferida.
A ausência de responsabilização
Até o momento, não houve responsabilização direta pelos erros cometidos. A Polícia Civil da Bahia, que deveria localizar o verdadeiro Jabison, não confirmou se o acusado foi encontrado. A Justiça, por sua vez, revogou o mandado de prisão contra Jabson, mas não se pronunciou oficialmente sobre o equívoco. O caso revela um sistema lento, desorganizado e que pouco se preocupa em corrigir suas próprias falhas. A ausência de responsabilização dá margem para que novas injustiças aconteçam, deixando o cidadão à mercê de um erro administrativo a qualquer momento. Quando o Estado não reconhece seu erro e não se compromete com a reparação, ele reafirma a impunidade institucional.
O caso de Jabson Andrade da Silva é mais do que um erro judicial: é um alerta urgente sobre a fragilidade do sistema de Justiça brasileiro. A prisão injusta de um homem trabalhador por causa de uma simples letra mostra que qualquer cidadão pode ser vítima de arbitrariedades quando os órgãos públicos falham em sua missão básica: a de proteger os direitos fundamentais. É preciso exigir que os procedimentos de verificação de mandados de prisão sejam revistos, que haja cruzamento obrigatório de dados, e que o erro humano seja minimizado por mecanismos de checagem mais rigorosos. Acima de tudo, é necessário garantir que ninguém mais perca sua liberdade — e sua dignidade — por causa de um descuido do Estado. Porque justiça de verdade só existe quando ela é feita com precisão, humanidade e responsabilidade.
Gabriela Matias, jornalista, redatora e assessora de imprensa, graduada pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB). INSTAGRAM: @gabrielamatiascomunica https://www.instagram.com/gabrielamatiascomunica/
Com informações de publicações em diversos sites, como https://vlvadvogados.com/ e site de notícias https://g1.globo.com/ba/bahia/noticia/2025/07/18/homem-investigado-por-crime-de-estupro-na-bahia-segue-foragido-inocente-foi-preso-em-sp-no-lugar-dele-por-erro-na-grafia-do-nome.ghtml