Hilário, que nasceu Josaphat mudou o seu próprio destino

João Alceu/Jornal Extra   
O homem que hoje atende pelo nome de Hilário, nasceu Josaphat (Bardal) e parecia ter um outro destino traçado. Primogênito de uma família de oito irmãos – três homens e cinco mulheres – aos 4 anos de idade sofreu o primeiro impacto negativo da vida: teve paralisia infantil, que lhe atingiu a perna esquerda, o que o deixou com necessidades especiais.

Morando no interior, mas cercado pelo carinho dos pais, seu Theodoro e dona Sofia, (filhos de imigrantes ucranianos) e pelos irmãos, Miguel, Terezinha, Marcília, Deonísia, Maria Joana e Liubina, cresceu. Com dificuldades como todos os que possuem necessidades especiais provocadas pela doença. Aos 12 anos, como já estudava em um seminário, decidiu o seu destino: seria padre.

Na década de 1950 os pais saíram do pequeno distrito de Ivaí (hoje Ipiranga, interior de Guarapuava). Hilário começou a estudar. Dedicou-se. Passou por todas as fases dentro do seminário, mas para ser ungido como sacerdote precisou de uma autorização especial de Roma. A Ordem São Basílio Magno (OSBM) lhe colocou como exigência apenas a realização de uma cirurgia, que lhe traria mais conforto e facilidade de locomoção.


Padre Hilário: “ganhei uma aposentadoria aqui”.                            
Tudo acertado. Tudo certo. A intervenção na perna lhe proporcionou mais conforto, recuperando em cerca de 70% o movimento do membro.

Aos 26 anos, Josaphat vestiu a batina de padre OSBM, prestou juramento e assumiu o nome de Hilário para começar uma nova vida. Vida abrigada e aquecida na batina dos padres ucranianos. Uma vida que lhe levaria a várias partes do mundo, inclusive à terra de seus pais e avós, a Ucrânia.

Padre Hilário tem hoje 80 anos de idade e já contabiliza 53 anos no sacerdócio. Divide a paróquia Assunção de Nossa Senhora, pertencente à mesma Eparquia cuja sede é em Prudentópolis, pertinho de Guarapuava, com o Padre Mário. “Ganhei uma aposentadoria aqui”, diz ele, com um meio sorriso no rosto.
Meio sorriso é apenas modo de dizer. Padre Hilário tem fala mansa, gosta de conversar. Seus paroquianos o elogiam, dizendo que ele é atencioso. Percorreu várias cidades antes de aportar nesta igreja. Esteve em Curitiba, em Prudentópolis, e na década de 90 do século passado foi para Roma, onde serviu como orientador espiritual no Colégio Pontifício São Josafat, ucraniano, claro.

Na terra dos avós
O nascido Josaphat e hoje Hilário lembra com alegria desse tempo na terra do Papa. Conheceu pessoalmente João Paulo II de quem tem ótimas lembranças. Sorri ao comentar a alegria de encontrar estudantes ucranianos e de todas as partes do mundo. Sendo neto de imigrantes ucranianos, aprendeu a língua ainda no seminário e em casa, onde os pais também preservavam a língua pátria.

“Quando estive na Ucrânia, me surpreendi ao ver aquele povo que havia sido dominado pelos russos durante a II Guerra. Eles tinham alegria nos olhos ao preservar seus costumes, suas danças, seus rituais, sua gastronomia. A Igreja continuava viva. As igrejas se mantinham cheias. Ninguém esqueceu as origens, mesmo sob dominação”, lembra o religioso, que retornou por outras três vezes à terra de suas origens.

Lembra com saudade dos tempos de antigamente. “As pessoas se preocupavam mais com a igreja, não tinha televisão e o rádio era um dos únicos meios de comunicação. Andava-se a cavalo e a demora para se chegar a um lugar fazia com que as notícias andassem mais lentamente”, diz ele.

E as tradições? Vê com certa nostalgia que os jovens não estão mais preocupados em preservar os costumes ucranianos. “Os garotos não sabem e nem querem saber falar o ucraniano. Estamos perdendo nossas origens”, constata.

Os passos lentos e a bengala de apoio não o impedem de atender os paroquianos com um sorriso no rosto. Não abre mão de um breve descanso no início de todas as tardes, compromisso assumido com o corpo, já cansado por tantas caminhadas para dar apoio aos mais variados problemas enfrentados pelos que frequentam a igreja.

Divide esse trabalho na paróquia ucraniana de Guarapuava (Assunção de Nossa Senhora) com o Padre Mário. Aos sábados o compromisso é com a missa que mistura português com ucraniano. Uma das maneiras de preservar a própria história.